domingo, 3 de fevereiro de 2008

A ODISSÉIA DE ULISSES – Um Zaratustra Empreendedor


Parte II

O Supermercado é perfeito: aqui não há apocalipses, não há vínculos, não há laços! {Quem precisa intimidades para ser [bem] atendido? (basta no máximo uma tabela do PROCON)} O que há são vínculos entre vínculos, são laços nos laços! A falsa superficialidade simbólica entre indivíduo e objeto de consumo é o bastante para toda satisfação e gozo.

Certa vez, numa dessas longas caminhadas pelos bairros do castelo do consumo, autruisticamente desviou-se para a racional e burocrática parte da estrutura; lá ouve sonora e docemente da boca da moça dos achados-e-perdidos:

- Ulisses! A vida é uma busca perdida, por isso não alcançamo-nos! O que temos em nós são poderes abafados... Somos um produto de algo que não deveria ter sido, logo devemos não-ser!!!

Ela não tinha propriamente um ar lolital, carecia de delicadeza melancólica, mas apesar disso e sem mais nem menos, responde ele a bela cordata:

- Apertados teus gritos de falsa liberdade! Encoleirados teus ais de pouca repressão! Beija-me a glande dos saberes e baba e suga um pouco do sumo do consumo. (...) pobre menina dos seios tão soltos (...) não conheceu ainda as propriedades de um sutién (...) observa Ulisses, antes deeeee.....e.ee..Eeee.........Ahahaaaaaaa.................

Ulisses agora está dividido entre o amor de algumas mulheres que já teve e as outras que fatalmente terá; mas nada o detêm, ele seguirá com sua tarefa até o fim!... A raposa agora não saliva mais na frente das galinhas, pois sabe a infinita possibilidade de tê-las todas; mesmo que por alguns minutos, na secção de vestuários, dentro dos provadores de roupas. Ulisses não deseja mais. Ulisses não ama mais. Na melhor das hipóteses, Ulisses consome...

Ah, o Supermercado, de fato, foi a melhor escolha. Agora o Unicórnio pode tudo! E então percebeu que ali estava toda possibilidade de mudança evolutiva da sociedade dos homens! - São belas todas as Secções e todas têm seu valor. (era uma máxima) - Um salve aos velhos jargões construtores das descompromisadas e vantajosas opiniões.

Um rapaz, ainda muito moço, que operava na Secção de Frios, perdeu a mão esquerda numa dessas máquinas afiadíssimas. Ulisses foi ter com ele, muito embora soubesse que aquilo não atrapalharia a produção naquele dia:

- Não se amedronte meu filho! Nenhum esforço será em vão para a verdade que está por vir...

Depois, nada como passear na temperatura agradável dos congelados e sentir-se gente, demasiadamente gente... Isso lhe proporcionava bem-estar e conseqüentemente sono.

Subitamente desperta Ulisses de um bom e prazeroso sono, patrocinado pela boa temperatura do ar condicionado, com uma luz ofuscante a lhe cegar. Apesar de não lembrar do sonho que tivera, podia jurar que tinha sido igualmente bom, uma vez que as boas sensações pareciam estar de volta ao seu corpo bem constituído. Então, ficando de pé, declama à luz pertinente:

- Oh, grande astro! O que seria de tu se te faltassem aqueles a quem iluminas? Desde de que cheguei aqui vives a me acompanhar sem cessar, eis o único que apesar de tudo ainda insiste em me seguir. Responde-me agora o porquê...

E de forma milagrosa falta energia no Supermercado. Nada demais. Uma pequena queda de força resolvida no intervalo de 1,325 segundos pelo moderno gerador, obrigatório em paraísos como este. No entanto, foi suficiente para mostrar a Ulisses que seus apelos ainda conseguem obter ressonância.

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