segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

GARDENAL


para Murilo Rubião.

Eu era um apenas um menino (na verdade eram eles que me chamavam de Menino) quando aquilo me aconteceu. Eu só tava ali há uma semana! Todos pensaram que era mentira; (as pessoas sempre pensam em si mesmas antes de delegar alguma possibilidade de verdade a alguém). Sei que tinha eu alguns “problemas” com o restante da vida social, mas não sei se “problema” é o nome adequado para o que eu realmente sentia.

Diziam lá que eu tinha um faro pra dor. Acho que por isso sempre me colocavam com os sujeitos mais dolorosos. O primeiro era o Adauto, Adauto era um cara em eterna crise: crise com a mulher, crise com a ex, crise com os filhos, crise com a mãe o pai e a puta que o pariu... Adauto só não tinha crise com o jogo do bicho! Porra, ele sempre ferrava alguma grana... O segundo era Arrimo, (todo mundo tirava onda com o nome dele, ele era gaiato, mas ele era solteiro e sempre andavam os dois.), Arrimo era um fotógrafo fuderoso! Tanto na operação da máquina quanto na visão do mundo.

Adauto e Arrimo estavam sempre disputando uma forma melhor de entrar em ambientes proibidos. Sempre querendo ver alguma coisa que ninguém imaginou e transformar isso em uma longa página do caderno. Incansáveis! Entravam em ambientes escusos e insalubres em busca de fotos sanguinolentas e cheias de dor e morte.

Minha função era só acompanhá-los com a maquinaria, mas sempre que chegava perto de algo assim, eles sentiam... Sentiam que algo estava diferente... Mas nunca era nada. Voltavam com fotos vazias e eu me perdia de sono e dormia no sofá. Esse foi meu erro, não devia ter dormido lá!

Foi quando chegou a missão:
Gritou Aldebaran, nosso pau mandado:
Existe um pequeno prédio na avenida Rui Barbosa no qual rolou um assassinato. Parece que o doidão do marido e a mulher e o filho e o cachorro e o caralho a quatro se fuderam numa situação inexplicada. Vão lá e me tragam o melhor... Saibam que o local está interditado, só que vocês são os tabacudos que tenho pra romper essa bagaça. Cuidado e não me tragam problemas pra cá, sendo pegos, já sabem, nós não temos nada com isso e eu nem sei porque estavam lá e mando demitir os dois.

Pensei:
O meu tá fora da reta! Vai se fuder otário... fechei os olhos e dormi mais um pouco.
[Essa porra dessa gente vive só da desgraça dos outros! Mal cheguei e já quero vazar!]

Nessa hora Arrimo cai no chão e finge uma crise epilética.
As pessoas se aproximam e ele espumando diz:
Só vou se levar o Menino comigo!
O povo ri e é quase unânime que eu tinha que ir.
Disse, em minha defesa, que precisava usar a copiadora pra imprimir coisas da faculdade. (Riram muito mais ainda.)

Fomos e chegamos num duplex abandonado. Eu disse que a gente tava no lugar
Errado. Ninguém me ouviu. Entramos e o ambiente era estranho, sujo e decrépto, mas sem fezes de mendigos ou pixações de gangues. Tudo em seu lugar. Fiquei meio noiado, foi quando me perguntaram:

Ei, Menino, tas sentindo o que?
Tem coisa aqui, né?
Tas com medo?
Eu disse:
Num tava não, mas vocês ficam me lombrando...

Foi quando Arrimo bateu uma foto da banheira!
DEUS DO CÉU!
(Eu gritei.)
Meti a luz em cima e não tinha nada.
Ele disse:
Tu viu?
Eu disse:
Vamo sair daqui.
VEM CÁ VÊ ESSA PORRA...
(gritou Adauto lá de dentro)
Corremos agoniados pra ver o que era e ele estava lambendo um colchão todo melado de sangue!
Arrimo começou a fotografar e o flash da câmera me dava mais apreensão, a cada feixe de luz eu via cenas diferentes.
Foi quando gritei:
Vocês Piraram!?!

Num impulso de loucura e pavor dei uma porrada violenta na câmera e corri o mais que pude pela avenida, já era madrugada e não me passava nada. Cheguei na sede a pé, lá pelas tantas da manhã.  Não havia nada. Não havia ninguém. Era bem ali, perto do Rosarinho. A casa estava fechada e eu morto de cansaço.
Forcei a porta e me sentei no velho sofá, tirei um cochilo e pensei:

Por que voltei? Mal voltei e já quero vazar!

No fim é tudo FUTEBOL


Ato 1

Pedalava para casa
{estava bebendo e era noite [ao mesmo tempo gritava: PRENDAM-ME OS PURITANOS (e refleti: será que existe um tempo de ser puritanamente preso?)] DENTRO DE UM VESTIÁRIO DE FUTEBOL FEMININO...}

(Quando cheguei em casa minha Mãe falava verborragicamente sobre o rádio e as notícias do rádio e os protestos da educação e o salário dos vermes dos vereadores...)

Lembro-me de quando era um tanto jovem e imberbe e sentia algo tão especial pelo meu Time, sentia que iria ser tudo diferente, sentia que podia ser antropologicamente igual; ou então somente um pouquinho mais ou menos igual!

Sempre achei que o mundo todinho (tomando Todynho) podia mesmo ser uma grande merda. – mas fiz parte dessa lombra louca toda que foi pintar o meu ESTÁGIO – Ah, conheci todos os recantos de uma arquitetura futebolística...

Ato 2

?Acho muito chato isso...!
Que tipo de amigo é esse que sempre tem só críticas?
Prefiro os “amigos” de clitóris... (disse alguém na platéia...)?
Parece bem agradável sentar a sombra do cajueiro e viver com as roupas cheias de nodoas... ?
Parece bem agradável, ser somente um ser deitado numa rede com os pés arrefecidos na água...?
Mas, tive que trabalhar...?

Ato 3

O sol era escaldante, como sempre é no subúrbio, e meus conhecidos falam errado pra caralho.

Pintávamos as arquibancadas do Mais Querido Clube das Multidões e Tarlos mandava assim com sua voz de rapaz musculoso:
- cigarro e café...
(e depois gritava):
CIGARRO E CAFÉ!
Riamos como peões bêbados de som e sol.
Ele dizia:
Olha o Pluct Ploct!
(era a venda de cigarro com chicletes...)

Depois dizia:
A seleção vai tocar aqui...
Eu perguntava:
Tocar o que?
E ele:
Vai tocar o terror, menino... Vai botar quente...
[OBS: Nem pensávamos em Tomário ainda.]

(sempre gostei de Tunga, acho que por influência do meu irmão; ainda gosto.)

Ato 4

Tinho sempre me protegia e eu era quase como um pupilo dele.
Teraldo queria algo a mais; ele era desse jeito, porém era de outro também.
Tardoso era muito chato e brigão pra cacete, embora retórico.
Tereira era muito louco e sempre condescendente, mas torcia por outro.
E Funk-Tulha era o mais foda, ele sofria de uma micose na época, meti IODO nele, e ele se fudeu com classe!
Mas Tunga era sempre Tunga!
Tomário, ainda era um chato sonho!

Ato 5

Percebi que o mundo não era só as arquibancadas.
Tive meu primeiro grande amor, simultaneamente a outros amores, e vive a falência dos que se amam.
Dona Terônica (mãe do amor naquele momento) me disse que o time dela ia vencer...
Venci dona Terônica e Tatrícia já não me queria mais.
Tatrícia anda só pela trácia e eu ando só pelos campinhos de pelada.

Perguntei a Tico sobre uma paixão:
E disse ele:
MULHER SÓ PRESTA QUANDO GOSTA DA GENTE.
Eu disse baixinho:
Eu sou insubstituível!
Ele disse em tom absurdamente normal:
Ela não pensa assim, meu querido.

{reflexionei só: quase tudo é futebol}