sexta-feira, 22 de junho de 2007

Beber é bom, nas curvas da estrada...

Chegamos ao bar.
Estávamos nos sentando quando de repente uma Barata entra em minha bolsa. Eu não a vi entrar, mas ela entrou. O que eu pensava nessa hora? Pouco importa. O que a Barata pensava nessa hora? Isso importa. Éramos três. Estávamos quase diletando a respeito de alguma bobagem holística (do tipo Fritjop Capra misturado com Darci Ribeiro) quando o rapaz do boteco me pergunta o que vamos beber. Quero conhaque, porém, contudo, todavia... (sempre quis escrever isso!). Cachaça é mais Barato (perceberam a questão de gênero?). Tudo bem, whatever. Não tenho grana, mas meu cérebro está em liquidação. Me vendo mesmo e ainda passo nota se precisar. Somos três, como disse, e não posso me dar ao luxo de beber sozinho.

Tom, um dos caras que estão comigo, o outro é Jalu, começa a falar do seu projeto (que na verdade não me interessa em nada) e que tem haver com o livro de um desses caras – ou dos dois. O velho papo de física quântica de sempre. Nem sei pra quê estudo alguma coisa. Ele fala e fala e fala, pausadamente, qualquer bobagem semi-metafísica, como se isso fosse resolver o problema da humanidade. Jalu vira uma lapada de cana; o que já me deixa com uma vontade mesquinha de beber logo pra que não se acabe e eu permaneça sóbrio com cara de intelectual triste e compenetrado.

A Barata caminha em minhas coisas dentro da bolsa. Penso na gostosa da professora de metodologia científica. Não sei porque diabos ela entrou em minha bolsa. Boto a bolsa no chão, apoiada em minha cadeira. Mas a bolsa já estava no chão. Então finjo que vou botá-la em meu colo. Mas a deixo no chão. A Barata (assim como Jalu) pensa que: tudo o que é vivo persevera no Ser. Mas minha bolsa não a deixa expandir seu pensamento. Tom pensa e fala que minerais são "vidas" e que também têm perseverança por serem produtos de uma mesma substância que também forma a vida. Algo como uma essência. Pergunto se essa essência é de morango ou baunilha. A Barata discorda e Jalu também... Então peço outro quartinho-de-cana pra aproveitar a noite como bom sujeito liso que sou.

Tom fala que o povo brasileiro é privilegiado por algum motivo antropológico que não ouvi, (ou era sobre a industria cultural? Já disse, não ouvi.), pois estava bebendo minha cana e pensando em como é que eu vou comer minha namorada logo mais a noite. A Barata pensa em como seria a vida se fosse possível copular com o prazer de uma sexualidade sem culpa. Jalu compra batata-frita numa barraca sem fiscalização da vigilância sanitária e revela que é um Hegeliano assumido. A essa altura eu já tomei umas e começo a achar a conversa, no máximo, interessante. Sou mais inteligente quando bêbado. Só que a Barata está preocupada em como vai voltar pra casa àquela hora da noite, visto que minha bolsa é por demais escura por dentro. Eu sei, eu já estive lá!

Vou embora, despeço-me, mas antes recito um poema. Minha vida é um eterno retorno de minhas performances. Dou uma carona, dou duas caronas, minha menina chega, ela já havia chegado, vamos comer comida japonesa num restaurante popular e beber mais alguma coisa, por conta dela; quando chego em casa desmaio em minha cama. Já no meu quarto, a Barata em minha bolsa pensa no quão holista e confortável é esse mundo pós-moderno e toda sua picaretagem, mesmo sabendo que na semana que vem vai ter que voltar pro nada...

quinta-feira, 7 de junho de 2007

DIÁLOGO SUPRA-SURREAL ENTRE BENJAMIN E McLUHAN

introdução involuntária

Esta breve comunicação, traz às cordas da ciência uma conversa meio discursiva e quase despretensiosa entre dois personagens hipotéticos "desconhecidos" (num momento em que a razão técnico-metodológica do conhecimento dá lugar ao “grande” poder do discurso – e olhe que não estamos falando de Habermas nem de Foucalt.).

Tratamos aqui, mesmo lúdica ou oniricamente, de Walter Benjamin e sua arte reprodutível e de Marshall McLuhan e suas extensões humanas. Sem a pretensão de apontar nitidamente pontos de convergência ou divergência entre os autores e suas teorias, contudo transportando-os a um outro mundo onde a interpretação ou interação também é possível; dando oportunidade de explanação dos pensamentos de tais personagens e seus tormentos humanos de observadores e intérpretes da realidade.

A fim de transformar e atualizar suas análises, derramaremos aqui a visão dos autores, a partir do “ponto de vista de outrem” (mesmo que este (o ponto de vista) de nada valha) que não seja o deles nem o de ninguém; mesmo que o ninguém seja o autor deste trabalho...

Primeira e única parte:
Eis o encontro e a confusa discussão dos olhares.

Dez e pouca da manhã, sábado ensolarado e típico, estavam no mercado público de Camaragibe... Os artesãos já não existem mais ou transformaram-se todos em hippies e rastafaris. Os feirantes comunicam em alto e bom som o valor – aurífico – de suas mercadorias e a comunicação se ex-tende por toda fedentina do mercado (transformando aquele lugar). Os alto-falantes, das rádios difusoras, nos postes, prometem animação cultural e artística, logo mais à noite, na praça.

Caminhando por entre as barracas, Mac e Ben convencem-se de que precisam sentar e tomar um quartinho para clarear as idéias.

Na barraca de Biu, todos estão de olhos vidrados na tv onde um programa esportivo passa os gols da rodada. Na mesa ao lado o sujeito do açougue não se cansa de comparar a garota da sua rua com, como ele mesmo se refere: "a gostosa da Britney Spears"!

Mac, oferecendo um brinde, ergue o copo e diz:
- Estamos nos aproximando rapidamente da fase final das extensões do homem...

Ben franje a testa após entornar a bebida e mantêm-se calado sem demonstrar abalo algum. Isso, obviamente, faz com que Mac continue sua explanação, sentindo que precisava explicar melhor o contexto; e continua:
- Falo da simulação tecnológica da consciência, pela qual o processo criativo do conhecimento se estendera coletiva e corporativamente a toda a sociedade humana, tal como já se fez com nossos sentidos e nossos nervos através dos diversos meios e veículos. Qualquer extensão - seja da pele, da mão, ou do pé - afeta todo o complexo psíquico e social.

- Encaras a obra de arte como uma extensão humana e também como passível de simulação tecnológica? Pergunta Ben, interessando-se pela conversa.

- Sim, mas...

- Digo-lhe antes de tudo que em sua essência a obra de arte sempre foi reprodutível. O que os homens faziam e fazem sempre podia e pode ser imitado por outros homens. Em contraste, a reprodução técnica da obra de arte representa um processo novo, que se vem desenvolvendo na história intermitentemente, através de saltos separados por longos intervalos, mas com intensidade crescente.

- É meu amigo! Fim da era mecânica, entrada da era da eletricidade. Chega de lentidão e de retardamento nas reações, hoje ação e reação ocorrem quase que ao mesmo tempo. É por isso que eu digo: A luz elétrica é informação pura!
Neste momento, na entrada do mercado, fleches e objetivas de câmeras fotográficas metralham o corpo de um garoto atropelado que tinha como ofício os malabares que fazia num semáforo ali da frente. O Biu da barraca comenta que foi vingança e que o rapaz andava fumando muita maconha; todos ouvem, mas ninguém liga.

Ben diz:
- Vê como o olho apreende mais depressa do que a mão desenha? O processo de reprodução das imagens experimentou tal aceleração que começou a situar-se no mesmo nível que a palavra oral - como esse relato do nosso amigo Biu. Agora aquele menino está contido virtualmente na fotografia.

- Graças aos meios elétricos, esta também é a Idade da Angustia! Responde Mac levantando novamente o copo e tomando uma talagada.

- Só que mesmo na reprodução mais perfeita, um elemento está ausente: o aqui e agora da obra, lugar onde se desdobra sua história, sua existência única. O aqui e agora do original constitui o conteúdo de da sua autenticidade, e isso escapa a sua reprodução técnica!

Fala Ben e fica de pé para ir ao banheiro, enquanto Mac o segue dizendo:
- Todas as culturas possuem seus modelos de percepção e conhecimento, que elas buscam aplicar a tudo e a todos. Numa cultura como a nossa, há muito acostumada a dividir e estilhaçar todas as coisas, como meio de controlá-las, é muito chocante lembrar, para efeitos práticos e operacionais, que o meio é a mensagem.

De dentro do banheiro grita:
- O que é que isso? Liquidação da cultura? Eu sei que o meio, assim como a arte, age direto no indivíduo e no social...

Enquanto continua Mac, um tanto mais perto da porta do banheiro:
- Claro, claro!... O conteúdo de qualquer meio ou veículo é sempre um outro meio ou veículo. Por exemplo, uma pintura abstrata representa uma manifestação direta dos processos do pensamento criativo, tais como poderiam comparecer nos desenhos de um computador...

- E a autenticidade? Responde Ben saindo do WC e dando a vez a Mac que entra em seguida. - A autenticidade de uma coisa é a quintessência de tudo aquilo que foi transmitido pela tradição, a partir de sua origem, desde sua duração material até o seu testemunho histórico. O que se atrofia na era da reprodutibilidade técnica da obra de arte á sua aura.

- E não foi isto o que aconteceu tanto na Física como na pintura, na poesia e na comunicação? A partir do momento em que o seqüencial cede ao simultâneo, entramos no mundo da estrutura e da configuração.

Neste momento aparece um pedinte, desses mendigos metidos a poeta (ou seria melhor profeta?). Ele entra na conversa e depois de tomar uma dose no balcão e filar um hollywood do Ben, retruca alvoroçado: "O grande estadista, o conquistador, o descobridor estão disfarçados com as suas criações até ao irreconhecível. A ´obra`, a do artista, do filosofo, só ela inventa quem a criou, aquele que dizem que a criou."

Então eles resolvem pagar a conta e sair andando para se livrar do bêbado impertinente metido a pensador. E Ben pergunta:
- Voltando ao assunto, você não tem medo que a aura suma? Cê sabe que a arte tem uma função ritual e um fundamento teológico!? E esta figura singular que é a aura, composta de elementos espaciais e temporais: a aparição única de uma coisa distante, por mais que ela esteja. Pois veja, no momento em que o critério da autenticidade deixa de aplicar-se à produção artística, toda a função social da arte se transforma...

- Acho que o sujeito está preso aos meios e as tecnologias como em uma prisão sem muros; em constante conflito e em guerra com os mundos artísticos e do entretenimento.

- Mas quem sabe... (E é interrompido).

- Quem sabe o artista sério não é a única pessoa capaz de enfrentar, impune, a tecnologia, justamente porque ele é um perito nas mudanças de percepção?

- Sabe do que mais? Precisamos é de uma outra pinga. Ao Cubismo, ao Dadaísmo, ao Surrealismo, ao Modernismo...

- Ao Cinema Latino Americano Independente!...

- À Pós-contemporâneidade.

- Qual foi cara? Que papo é esse de Pós-contemporâneo?

- Brincadeira, mago, relaxe...